Este post foi escrito em 16 de Outubro de 2007. Foi escrito na 1ª pessoa, porque sim. Mas era sobre Adriano e sobre sonhos, e lutas, e desencanto e memória.
Três anos depois o desencanto voltou a tornar-se, de novo, menos suportável. Aprendemos a sobreviver-lhe sim, mas cada dia vivemos menos. Os novos homens de cinzento não se cruzam connosco na estação do Parque, mas tiram-nos o nosso presente e o o nosso futuro, no Terreiro do Paço.
Galiza voltou a estar com os campos ainda mais vazios. E com ela, nós estamos todos mais vazios. E mais pobres. Para além de tudo o que os donos do mundo nos tiram, a morte leva os melhores. E não fosse sermos teimosos e recusar, à morte, a vitória sobre a memória e sobre o sonho, a solidão já tinha vencido. Mas não. Ainda não.
A pouco mais de um mês da Greve Geral, cantemos Adriano, com saudade mas, sobretudo com garra. E, um dia, se a gente assim quiser, os campos de Galiza voltarão a encher-se de homens e mulheres livres.
Um dia viemos a Lisboa, a minha primeira vez em Lisboa. Não tivemos bilhete. Passamos a noite, enquanto esperávamos pelos que tinham conseguido entrar no Monumental, a descer e a subir as escadas rolantes da Estação de Metro do Parque. Devem ter cantado, bem alto, que há sempre alguém que resiste...enquanto eu crescia, pela primeira vez numa viagem só de amigos, pela primeira vez a ver a cidade, pela primeira vez a ter um gozo especial a imaginar que os homens que passavam por nós, com gestos e roupas e passos cinzentos e conhecidos de outros lugares e de outras noites, não faziam ideia que aqueles putos tinham vindo a Lisboa para "Os" ouvir....
Um dia, muitos anos depois, vi o Adriano na Festa do Avante. E aqui está o problema. A memória é o que queremos fazer dela. Eu sei que vi e ouvi o Adriano na Festa do Avante, mas não me recordo. Desse tempo a memória apagou muitas coisas. Possivelmente porque tinha voltado a haver campos de solidão. Porque os rios tinham voltado a levar tantos sonhos ou a trazer muitas mágoas. Não tinha voltado a noite, mas o Sol dos dias tinha-se tornado menos Sol. E, neste engenho de recordar, não consigo recordar a solidão que voltara e as nuvens que se vingavam, sem dor. Não me lembro, então....
Daquele tempo, o da solidão vencedora, a imagem que tenho de Adriano é a de um homem só....Os campos da Galiza voltavam a ficar vazios. E com eles, muitos de nós.O tempo acabou por tornar o desencanto suportável. Ou talvez não. Talvez apenas tenhamos aprendido a sobreviver-lhe.